Caso você tenha conhecimento de alguma situação de violação de direitos de crianças e adolescente. Denuncie, por meio do Disque 100 ou Procure o Conselho Tutelar de sua cidade.
Caso recente de criança de 04 anos de idade, morta pela tia na cidade de Uruçuí por espancamento, chamou a atenção de toda a comunidade, reportados nos meios de comunicação socais de nosso Estado.
A violência contra crianças e adolescentes, infelizmente é problema endêmico no Brasil, como atestam dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública ( https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2021/12/violencia-contra-criancas-e-adolescentes-2019-2021.pdf). A maioria das violência ocorre no espaço intrafamiliar, que deveria ser o lugar especial de proteção.
Segundo o noticiado pela mídia a criança e seu irmão teriam sido entregues, sem decisão judicial, para a tia, residente no Piauí e que há cinco meses estavam com a criança, tendo-a espancado, ocasionando a sua morte.
Caso esse fato assim se tenha ocorrido, verifica-se uma fragilidade na rede de proteção à criança ou adolescentes, pois uma criança sob medida de proteção de acolhimento institucional, não pode se entregue sem a devida ordem judicial, amparada em estudo técnico de assistente social e psicóloga e acompanhamento posterior, além do fato da necessidade de controle por parte do Sistema de Justiça do acolhimento de crianças.
Gostaria de chamar a atenção para o caso no seguinte ponto: há uma crença por parte dos profissionais da rede de proteção ( incluindo os profissionais do sistema de justiça), de que crianças que necessitam ser retiradas de sua família natural devem ser acolhidas no seio da família extensa, que teria um preferência em relação a outras pessoas e famílias, aptas a acolher essas crianças.
A família extensa, de acordo com o art. 20 do ECA é aquela que se estende ( por isso, extensa) para além da família natural, ou seja, aquela composta por pais e filhos, adotivos ou biológicos. A família extensa, por sua vez, sãos os demais parentes, como avós, tios, etc.
Quando há a necessidade de retirada de uma criança de sua família, essa pode ser inserida em programas de acolhimento ( institucional ou familiar ) ou colocadas em família substituta, por meio de guarda, tutela ou adoção.
Esse processo ocorre, geralmente por meio de guarda, oriunda de medida protetiva, ajuizada pelos órgãos do Sistema de Justiça ( Ministério Público) ou por meio de ação própria, ajuizada pelo interessado.
É comum no processo de medida protetiva de colocação em família substituta, por parte dos atores da rede de proteção e de justiça, a ideia de que a criança/adolescente deve, obrigatoriamente, ser inserida na família extensa. Com isso inicia-se um verdadeira peregrinação, por parte de técnicos do judiciário, dos serviços de acolhimento de conselheiros tutelares, pelo Ministério Público, de parentes para "ficar" com a criança ou adolescente.
Essa atitude, no entanto, não passa de uma crença jurídica ( acreditamos ser o certo pela lei), pois o texto legal coloca um certo limite para o conceito de família extensa, sendo os seus membros identificados com aqueles com quem a criança possui vínculos de afinidade e afetividade.
Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
A partir disso é preciso deixar claro. Não é por se parente que o membro da família extensa está habilitado para receber a criança. Se a criança nunca conviveu com o membro da família extensa, não há afetividade clara e evidente, não há porque ser a criança inserida no seio de uma família extensa com a qual não há vínculo nenhum e nem se verifique uma relação anterior de cuidado e proteção. Muitas vezes é melhor a inserção dessa criança em uma família sem qualquer vínculo de parentesco, mas preparada para receber crianças e adolescentes sob aplicação de medida protetiva, principalmente famílias acompanhadas pelos órgãos de proteção à criança e adolescentes.
Fundamental que os operadores do direitos da criança e do adolescente: Poder Judiciário, Ministério Público, conselhos tutelares, técnico das varas e dos serviços de acolhimento tenham como norte orientador o princípio do melhor interesse da criança, que não tem uma correspondência com suposto direito de parentes em obter a guarda de crianças e adolescentes, salvo isso se mostre realmente, com base em estudos técnicos, benefícios para aqueles.
Não quer isso dizer, que não se deva buscar a reconstrução ou construção de vínculos com a família extensa. Apenas que dizer que esses só tem preferência para acolher a criança/adolescente se houver vínculo comprovado de afinidade e afetividade, demonstrada por ações anteriores que denotem cuidado ou proteção. É perfeitamente possível a formação de vínculo, acompanhada por equipe técnica, estando a criança em acolhimento institucional ou familiar, para em modo gradativo, ser inserida na família extensa.
Por fim, o ECA privilegia o acolhimento familiar como política pública na garantia do direito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes, em razão dos inúmeros benefícios comprovados em comparação ao acolhimento institucional. Trata-se de um serviço da assistência social de alta complexidade, mas de baixo custo em comparação ao acolhimento institucional e que preparam e acompanham famílias para receberem crianças e adolescentes que tenham seus direitos violados e recebam medida protetiva por parte do Poder Judiciário.
É fundamental que os entes federativos ( União, Estados e Municípios) se articulem e garantam recursos para a implantação dessa política protetiva e nós, como integrantes da rede de proteção, buscar nos assegurar de mecanismos jurídicos que de fato protejam nossas crianças e adolescentes, sob o ponto de vista de proteção integral e da prioridade absoluta, previstas na Constituição e no ECA.
José Claudeir Batista Alcântara
Bacharel em Direito - Especialista em Direitos Humanos